quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Retratos de um certo"João Ribeiro dos Santos"

Rio de Janeiro 15 de junho de 1984

Nascia nessa data João Ribeiro dos Santos, primeiro filho do casal, José Ribeiro e Maria Dos Santos. Moradores da Zona Norte do Rio, mais precisamente na Vila Cruzeiro próximo á Igreja de NSRA Da Penha.

Desde a chegada de seus pais, avós do pequeno João, o jovem casal aprendeu desde muito cedo a lidar com as dificuldades ocasionadas pela falta de oportunidades e pela grave crise econômica atravessada pelo país nesse que seria o último ano de um Militar como Presidente do Brasil.

Mesmo com todas as desvantagens, tanto José quanto Maria, esforçavam para oferecer o que existia de melhor para o primogênito. José dava duro trabalhando como pedreiro e a mãe fazia bicos como lavadeira em bairros da Zona Sul carioca. Os anos se passavam e as dificuldades aumentavam e para o jovem João, então com 10 anos, a realidade socioeconômica dos pais já era enfrentada com bicos (trabalhos esporádicos)em feiras e estacionamentos de comunidades próximas.

Ao despertar de uma manhã, no dia 18 de junho de 1998, João no auge de sua adolescência, ao deparar-se com alguns amigos da comunidade vestidos com roupas de grifes famosas e tênis de marca importada, resolve questioná-los sobre a origem dos bens de consumo: "Pô meu irmão, onde tu descolou esses panos maneiros? Joãozinho, compramos com o dinheiro daquelas paradas de vendas no baile funk semana passada"

O poder se sedução imposto pelo consumismo, gera em João curiosidade e uma sensação de impotência perante o desejo de usufruir de tudo o que o dinheiro pode oferecer. Em outras palavras, ostentação, desejo e vontade. Pronto, essa mistura é suficiente para convencer João a ingressar no "lucrativo comércio" e com os frutos dos dividendos ajudar os pais no sustento da casa e na criação dos irmãos.

Fim, pelo menos para o nosso personagem, pois com a ocupação das forças de segurança comandadas pelo Governador do Rio de Janeiro, ou melhor, "Exterminador do Futuro" Sergio Cabral, João foi morto após confronto com Policiais Militares. Deixou como herança um filho, dois irmãos e mãe viúva. Para o poder público, João é apenas mais um em meio a tantos outros flagrados em fuga pelo helicóptero da Rede Globo. Para Dona Maria e seus irmãos João era o alicerce para o sustento do lar.

Em meio ao "tiroteio" de opiniões diversas como, por exemplo, "bandido tem que morrer", ou "traficante bom é traficante morto", podemos lançar uma proposta; façamos um resgate da história de tantos outros jovens: se não houvesse o abandono gritante do poder público e distância dos meios de comunicação, por certo a trajetória de tantos Joãos, Marias, Josés, Marcios e Fernadinhos poderia ser diferente ou talvez, com mais opções de escolha se não o tráfico e a criminalidade. Porém o jogo de poder e a indústria midiática não oferecem essa abordagem, sim muito mais lucrativo e benéfico para audiência é a "guerra entre mocinhos e bandidos", que vença o melhor e o mais bem preparado, o justo, honesto e corretíssimo "sistema".


Alexandre Souza, jornalista e escritor

6 comentários:

  1. Meus Parabéns pela matéria Alexandre....
    Infelizmente o poder público nunca fez nada para essas comunidades,como também nunca se empenharam para melhorar a vida do sertanejo,esse povo tão sofrido que a única coisa que a diferencia da comunidade dona Marta,é a geografia e os costumes.
    Oque mais me incomoda é a passividade da população,que só se preocupa com seu próprio umbigo e com a novela das 20:00.
    Grande abraço,grande texto.
    NETO DUARTE.

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  2. Infelizmente, essa é uma realidade em nosso país. Os verdadeiros culpados são aqueles que todos sabemos e a impressão que fica é que somos todos fantoches de um circo que nunca acabará, o circo dos horrores.

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  3. Infelizmente o único poder público que chega até as populações desprivilegiadas é a polícia, onde o correto seria também hospitais, educação (escolas profissionalizantes), etc...
    Parabéns pelo ótimo artigo, abraço.

    Marcelo Moretti

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  4. O poder público apenas quer a manutenção do poder e atua dessa forma para dar continuidade na política de exclusão do mais necessitado.

    Infelizmente pouco mudou nos últimos tempos.

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  5. Oi Alexandre!!! Muito legal a sua matéria, Parabéns!

    É um assunto muito amplo, mas vou tentar simplificar o que acho. Quanto a vida de João, não concordo com o fato dele ter ingressado no crime por causa de sua "situação pobre". Pois pelo seu histórico familiar essa é uma situação que já vem sendo passada desde os seus avós e pelo que foi dito, foi criado por pessoas que sempre deram duro sem ter que roubar ou matar.
    E no primeiro momento essa atitude veio pelo desejo do consumismo e não pela necessidade familiar propriamente dita. Conheço muitas pessoas que vivem nessas Comunidades, jovens como o João, mas que mesmo não tendo o melhor emprego são sim, honestas e trabalhadoras
    e que convivem diariamente com o crime. Por isso, na minha opnião essa foi uma escolha do João e ninguém teve culpa.
    Agora, obviamente o Poder Público nunca olhou por essas Comunidades e com certeza se houvesse uma Educação melhor e mais ampla (Escolas profissionalizantes e Faculdades), Hospitais Públicos dignos, Transporte, Lazer, enfim... Essas pessoas tendo uma assistência Pública saudável, teriam um “curriculum” suficiente para
    conseguirem empregos melhores e com uma remuneração melhor.
    Pois pra mim, qualquer emprego é digno...

    Deixo bem claro, que estou dando a minha opnião quanto a vida do personagem João e que em nenhum momento estou generalizando as outras pessoas que por algum outro motivo estejam nesse "lucrativo comércio".

    Fique com Deus e continue assim...

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  6. Esse assunto dá pano pra manga.... enfim, é complicado afirmar, mas se nada for feito, as crianças de hoje serão os ““bandidos”” de amanhã, é aquela história, filho e neto de advogado, é advogado, filho, sobrinho de engenheiro, é engenheiro, quem cresce com problemas dentro de casa geralmente não tem muita opção...... (ninguém quando nasce escolhe ser isso ou aquilo, o meio externo tem muita influência na formação da pessoa) até as crianças sabem disso, assista ao novo filme Megamente (ele mostra exatamente isso, acredita?). Vejo muitas pessoas que puderam estudar, nunca passaram fome, frio e sempre tinham aquela cama quentinha esperando em casa alegando que sempre é possível escolher o próprio caminho entre o certo e errado, mas desta forma quando já tem a personalidade formada, é muito fácil falar!

    Estão todos felizes com a polícia pacificadora no morro, mas será que o pessoal que saiu de lá vai ficar no prejuízo ou irão buscar novos clientes e mercados para oferecer seus produtos (quem sabe cidades com menos policiamento)? Mas será que terão algum apoio, opção para um recomeço, uma nova forma de viver?

    Enfim, sei que muita gente honesta, que não tem nada a ver com isso também está se despedindo de suas famílias e mesmo assim, continuam frisando que a operação no morro foi um sucesso!

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